Pará: Belo Monte, sangria fiscal permanecerá?

Se não houver, nos próximos anos, nenhuma mudança na legislação tributária, notadamente no tocante à cobrança do ICMS, o Estado do Pará vai perder integralmente a receita gerada pela energia da Hidrelétrica de Belo Monte, cuja construção deve ser iniciada em menos de um mês. Vai se repetir, assim, em escala ampliada, o fenômeno das perdas que o Pará já sofre hoje com parte da receita tributária da usina de Tucuruí, no rio Tocantins, em montante que pode ser estimado, com base nos números disponíveis, em mais de R$ 1 bilhão por ano.


Como Belo Monte terá capacidade de geração superior a Tucuruí e o Pará já conta hoje com grande volume de energia excedente, um cálculo ligeiro projeta em valor próximo de R$ 2 bilhões anuais o montante das perdas com ICMS que o Pará vai experimentar com a usina do Xingu. Nos dois casos – Tucuruí e Belo Monte –, o Pará deixa de arrecadar imposto sobre toda a energia comercializada para fora do Estado. A cobrança do ICMS, pelo que determina a legislação, só incide sobre a energia consumida dentro do Pará. A energia exportada vai gerar receita para os Estados importadores.



A Eletronorte informou esta semana que, com a nova regulamentação do setor elétrico, o valor de energia da Hidrelétrica de Tucuruí, para comercialização, passou a ser a sua garantia física, o equivalente a 36,2 milhões de MWh. Desse valor, 34,3 milhões de MWh foram comercializadas através de contratos, em 2010, e a diferença liquidada na Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). Do total comercializado através de contratos, nada menos que 23,3 milhões de MWh, ou 68,09% do total, foram para fora do Pará, ficando o Estado com menos de um terço.


PERDAS


Apesar da exportação maciça de energia, o consumo interno ainda rendeu ao Pará no ano passado, em receita de ICMS, R$ 527,5 milhões, sendo a quase totalidade (R$ 506,8 milhões) decorrente da energia comercializada pela Celpa. A Eletronorte recolheu de ICMS no ano passado R$ 20,7 milhões, sendo R$ 4,2 milhões incidentes sobre a receita de contratos com consumidores livres no Pará e R$ 16,5 milhões relativos a quatro contratos de fornecimento cativo, firmados com grandes mineradoras.


O potencial de arrecadação do Pará abortado pela legislação que rege o destrambelhado sistema tributário nacional, porém, não se resume à sangria do ICMS incidente sobre a energia elétrica. Aliás, esta nem chega a ser a maior perda. A desoneração das exportações, estabelecida pela Lei Kandir em 1996, já provocou sobre as finanças do Pará um estrago avaliado em mais de R$ 21 bilhões, segundo cálculos conservadores. Seria dinheiro suficiente para fazer 70 Alças Viárias ou cerca de 850 mil casas populares.


E não é só isso. Embora dê uma contribuição formidável para o balanço cambial do Brasil, ao produzir o segundo maior saldo da balança comercial do país – só no ano passado foram quase US$ 12 bilhões –, o Pará está ainda submetido a uma concorrência profundamente desleal com seus vizinhos da região Norte. De todos os Estados da Amazônia, apenas o Pará não tem áreas incentivadas que exonerem ou reduzam as alíquotas dos tributos que incidem sobre a produção, a comercialização e sobre o comércio exterior.


“O Pará está sendo vítima das vantagens tributárias dos seus vizinhos”, já alertou mais de uma vez o advogado Helenilson Cunha Pontes, um dos mais respeitados tributaristas do país e hoje vice-governador do Estado. O Pará, segundo ele, se transformou numa ilha isolada, e esse isolamento vem cobrando um preço excessivamente alto traduzido pela fuga de investimentos. A Federação das Indústrias do Pará (Fiepa), por exemplo, calcula que o descompasso de tratamento tributário mantém hoje os custos da produção industrial do Pará com uma elevação de 30% em relação aos seus vizinhos da região Norte. (Diário do Pará)

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