Tapajós, um Estado interessante

Ivan Lessa/ BBC Brasil


Não bastassem os progressistas 26 (ou 27? Há dúvidas) Estados e um Distrito Federal, que tantas alegrias nos têm proporcionado, em nossas terras abençoadas, e até mesmo aqui no pobre do exterior, tamanho o seu sucesso, que, mesmo sem o alto patrocínio ou chancela de Eike Batista, o sexto ou oitavo homem mais rico do mundo, vamos acrescentar mais uma unidade federativa ao nosso querido e progressista Brasil.


Seu nome aflora aos lábios e acaricia os ouvidos como rio correndo (chuá, chuá) ou árvore sendo derrubada (cataplum): Tapajós. Para que fique claro, repito silabando, Ta-pa-jós.


Deu certo o incansável movimento pró-plebiscito para a criação, ou parto pertinente, de um novo Estado dito “sustentável”, segundo seus acólitos, torcedores, outras redundâncias e algumas centenas de interessados.


O lema do Estado-calouro já foi bolado e decidido em plenário público sito numa das raras clareiras da selva amazônica (embora poucos brasileiros saibam da história toda).


Seguinte: “Tapajós, o estado verde da Amazônia.” Sim, verde, verde, que eles o querem verde, como poetas espanhóis, e não amarelo, fúcsia ou furta (epa!)- cor.



Sua composição já está traçada e resta a vocês, nas cercanias, ou lá pelo sul, prestarem atenção e admirar nosso indomável espírito auri-verde.


Tapajós terá 1 governador, 3 senadores, 8 deputados federais, bancada de 28 representantes de diversos municípios. Mais aquela gente que outros Estados mais velhos estão fartos de conhecer.


Segundo os anúncios oficiais, seu “centro estará mais próximo do povo”. Que povo? E como chamá-lo? Tapajoense? Tapajoara?


A empreitada custará a bagatela (eu sempre quis usar essa palavra) de R$ 901,8 milhões de reais, coisa que nosso bom, nosso grande (e da Alemanha também) Eike tiraria de letra. Isso apenas para construir e instalar a sede governamental, a assembléia legislativa, o tribunal de justiça, secretarias e outros prédios de igual importância.


Mas, peraí! Tapajós vai baixar de disco-voador? Surgir de um furacão como Oz, que veio e se foi, para Dorothy? Em absoluto. Temos nossos jeitinhos. E jeitões.


Tapajós (para quando seu hino?) será composto, caso Estado, ou composta, caso unidade federativa, do desmembramento do Pará, que, ao que tudo indica, está lá há séculos dormindo no ponto sem fazer bulhufas.


Tapajós será trinchada como um gordo leitão das regiões do baixo Amazonas e do sudoeste paraense. Tudo indica que sua capital será Santarém.


Não, não foi pedido nenhum projeto ao grande Oscar Niemayer. Sua área total de 722.352 km2, aliás a quarta maior do Brasil, terá de se virar com os talentos locais, cuja fama se espalha pela selva como Tarzan cruzando-a de cipó.


Afinal, serão 1.300.000 habitantes, muitos dos quais arquitetos alfabetizados e formados em universidades de outros grandes centros da Amazônia, já que a região não dá só pirarucu e madeireiros legais e ilegais.


O Instituto Brasileiro de Geografia (IBGE), aquele mesmo que, por capricho ou conveniência, tacou a Bahia, coitada, no nordeste, aponta que a região terá um Produto Interno Bruto (PIB) de R$ 9,173 bilhões, superior a dos Estados do Acre, Amapá e Roraima, quiçá (outra palavra na qual sou vidrado) da conta no banco da esquina favorecido pelo esplêndido Eike Batista.


É bom lembrar que o proposto, embora já garantido, Estado já apresenta, antes mesmo das licitações, nomeações e eleições, um dos índices sociais mais baixo do país.


Sem dar pelota à lingua e às estatísticas ferinas da oposição, o novo Tapajós garante que irá gerar perto de 200 mil empregos. Oba, oba!


E isso sem falar em sua importância para a segurança nacional e de nossas fabulosas usinas nucleares, embora não haja nenhuma por perto. Chegar-se-a lá, garanto, chegar-se-a lá.


Eu digitei “índices mais baixo”. Estou apenas tentando acompanhar, segundo as cartilhas oficiais, as evoluções e convulsões de nossa língua, nosso povo, nossa terra. Welcome to the farra, Tapajós.

Comentários

  1. Pela Constituição federal , somente a região que tem interesse em se emancipar é que vota no plebiscito.

    A senadora Marinor e o senador Flexa Ribeiro já está articulando contra o plebiscito e quer que todo o Pará vote, inclusive quem mora em Belém.

    Se os senadores Marinor e Flexa Ribeiro conseguirem mudar a legislação, dificilmente o povo de Tapajós e Carajás conseguirá se separar porque a população é menor nessa região.

    Por isso cabe apelar aos senadores do Pará que estão a favor da emancipação.

    A oportunidade é única de dividir o Pará, por isso é preciso lutar com todas as armas e não permitir que a Constituição seja mudada com emendas que favorece os contra.

    O deputado Giovanni Queiroz disse que vai recorrer no STF porque a medida é inconstitucional.

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